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terça-feira, 30 de novembro de 2010

Mito Nº1 - O Mito da potência


Uma coisa que detesto ouvir, ler é alguém se gabando que seu carro tem mais potência que o do seu amigo ou que um determinado lançamento tem um melhor rendimento só porquê teve sua potência aumentada com relação ao modelo anterior.

Nesse mundo da engenharia automotiva já ouvi várias versões pelo nascimento dessa "ganância" por mais cavalos:

  • "A pontência dá um número maior que o torque"
  • "A unidade 'cavalo' é mais amigável que nosso kgf.m"
  • "Torque não quer dizer nada, só me importa potência"
E por aí vai. Explicações sempre vão existir aos montes, mas o fato é que na minha opinião falar que um carro tem 100cv anda mais que outro que tem apenas 90cv é um tanto leviano e não acredito que corresponde a realidade em si.

Então: o que é potência e o que é torque? Qual a diferença entre os dois? (Vou tentar fugir o máximo do "engenherês" para dar essas definições)

Potência é por definição o consumo de energia (seja de que tipo for: elétrica, mecânica, química ou, no caso de motores de combustão, térmica) por unidade de tempo. No sistema internacional potência é medida em Watts, que é a mesma coisa de Joules/segundo (uma unidade de energia por tempo).

Pra facilitar vamos com um exemplo fácil:  se uma lâmpada consome 60 W, isso significa que a cada segundo  ela consome 60 Joules de energia elétrica.

Você pode se perguntar, o que esses Watts (tão usado em máquinas elétricas) têm a ver com a potência do meu carro?

A resposta nesse caso é simples: a indústria automotiva não usa a unidade padrão do sistema internacional de unidades. Então é usada a unidade cv (cavalo-vapor) que corresponde a 735, 49 Watts.


Em resumo,  a potência é uma medida de consumo de energia por unidade de tempo, não correspondendo diretamente ao desempenho de um motor, pois o mesmo pode ser menos ou mais eficiente termicamente para essa potência.

Já o torque é uma medida diretamente de força (meus amigos engenheiros vão me matar ao ouvir uma frase dessas). Digamos que no estudo da dinâmica de movimento não linear (física mesmo) o torque está para a força nos movimentos lineares.  Em português, quanto maior o torque de um sistema rotativo maior a força que ele é capaz de fazer.

Então no manual do seu carro, quando fala o torque máximo e a sua respectiva rotação é o ponto de maior força que o motor consegue fazer para impulsionar a sua caixa de marchas e, no fim, suas rodas motrizes (no caso da maioria dos nossos carros populares, as da frente).

Esse torque é medido na saída do motor, de alguma forma é acoplado um eixo no volante do motor e nesse eixo um freio (que pode ser mecânico ou eletromagnético). A força que esse freio fizer para manter o motor em uma determinada rotação é correlacionada com o torque (normalmente pelo diâmetro do eixo do freio).
Na foto o teste de um motor movido a Biodiesel numa bancada montada no CETEC em Belo Horizonte. Para maiores informações Clique aqui

Existe um meio de correlacionar o torque do dinamômetro e a potência de frenagem (ou a potência térmica do motor menos as perdas mecânicas dentro do motor):
P=T*rot

Traduzindo: para obter a potência em Watts entramos com o torque em N.m e a rotação em radianos/segundo. Com a transformação correta você sai do kgf.m e rpm para cv.

Na minha opinião, essa fórmula mostra que a potência é simplesmente o torque multiplicado pela rotação, ou, se preferirem, uma transformação de unidades.

Na imagem acima, a curva do Ford Focus 2.0 16V com motor mexicano. Podemos ver claramente que o torque máximo está entre 4500 e 5000 rpm e abaixo a curva do motor Diesel da Sprinter e fica claro a característica de motor Diesel ter o torque máximo em rotações bem baixas (1500 rpm).

Nessas imagens também fica bem claro que o motor não existem as fictícias faixas de torque e potência, o que seria impossível, já que em toda a faixa de rotação o motor precisa de "força" para manter essa rotação e, consequêntemente, potência.

Então, a potência divulgada pelos fabricantes nada mais é que o torque multiplicado pela rotação e as características da curva torque são muito mais fáceis para se avaliar, no papel, o desempenho de um motor.


6 comentários:

  1. Interessante esta abordagem do torque e potência. Normalmente as pessoas não intendem como um 1.0 VHCE de 79 cv não anda a mesma coisa de um peugeot 1.4. Blog já adcionado aos favoritos, parabéns.

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  2. e a reposta está toda no torque 9,7kgf.m a 5.200 rpm do VHCE e 12,85 a 3.250 rpm do Peugeot. Ainda dá pra inferir outras coisas, como o Peugeot anda bem melhor na cidade (devido ao pico de torque mais cedo).

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  3. Talvez fique mais simples dizer que o torque é a força que te empurra contra o banco quando você acelera e a potência é o quanto de velocidade final o motor consegue manter.
    Parabéns e sucesso. Blog adicionado!

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  4. Obrigado, Titica. Só um comentário no seu comentário: realmente, torque é "força" (as rodas fazem o trabalho de conversão do torque, rotativo, para força, linear), mas a potência é, como eu gosto de dizer, o torque mascarado. Mascarado por aquela formulazinha no meio do post. Se fizer as contas, para qualquer carro, a torque na rotação de potência máxima vai (obviamente) menor que o torque máximo e por isso, a rotação "mascara" o número.

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  5. "Em resumo, a potência é uma medida de consumo de energia por unidade de tempo, não correspondendo diretamente ao desempenho de um motor, pois o mesmo pode ser menos ou mais eficiente termicamente para essa potência."

    Pedro, na verdade a potência não indica o consumo de energia por tempo e sim o trabalho realizado pelo motor por tempo. Assim, a potência é líquida, ou seja, foram descontadas as ineficiências térmicas; de forma que um motor com maior potência deve apresentar maior desempenho que outro de menor potência, respeitadas as respectivas faixas de potência máxima. Carros mais potentes podem não ser mais rápidos que outros menos potentes, pois os carros podem apresentar diferenças na eficiência de transmissão, escalonamento das marchas, arrasto aerodinâmico, entre outros fatores que analisados em conjunto com a potência do motor indicam o desempenho do veículo.

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    1. José, primeiramente, desculpe pela demora em responder e obrigado pela participação.

      Em termos de engenharia, sem dúvida nenhuma a análise energética é extremamente importante e você listou corretamente vários dos fatores que roubam energia, que no fundo serão refletidas como força, velocidade, aceleração, etc., do carro, embora, mesmo em laboratório são difíceis de se obter e medir e em última instância são medidas a partir do torque medido no eixo do dinamômetro.

      Mas o objetivo do site é usar menos o "engenherês" e uma mais simples e direta e de aplicação prática. No caso específico deste post critico veementemente a postura da população leiga e influenciada pela imprensa especializada sobre como carros com potência maior são melhores.

      Um exemplo prático que ocorreu há algum tem aqui no nosso mercado. A maioria dos 1.0 passaram por um aumento significativo na potência declarada pelos fabricantes, não vi uma revista ou site especializado falando em piora de desempenho, ao contrário, todos analisavam friamente que carro tal aumentou 10 cv e isso era melhor. Mas isso é realmente melhor para quem dirige o carro?

      Sendo mais específico e pegando um modelo como exemplo: o motor FIRE 1.0 no Siena. Até 2007, tinha 65 cv e em 2008 passou para 73 cv (+12%), sempre na gasolina, com um pequeno aumento no torque, de 9,1 kgf.m para 9,5kgf.m (+4%), mas a grande diferença está onde ocorre este torque máximo. No primeiro caso a 2500 RPM e no segundo a 4500 RPM.

      Logicamente, para uma análise detalhada, precisaríamos saber como é a rampa de subida na curva de torque nos dois motores, mas me arrisco a dizer que quem comprou esse carro para andar nas ruas de uma cidade de relevo acidentado e tiver um sentimento um pouco apurado do comportamento do carro vai notar o aumento na dificuldade de enfrentar os morros.

      Espero que tenha esclarecido meu ponto de vista sobre esse mito da potência e sinta-se a vontade para participar mais!

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